OS CISNES SELVAGENS

 

Essa foi a versão que eu tive quando era criança.

 Um dos meus contos preferidos pra vida toda é Os Cisnes Selvagens de Andersen. Desde pequeno eu já conhecia, por conta de um livrinho da coleção de contos de fadas. É a história de uma princesa chamada Elisa que, após seu pai viúvo casar-se com uma mulher má e feiticeira, tem seus irmãos transformados em cisnes e é mandada embora para viver com camponeses. Após alguns anos, e a princesa já ter se tornado uma moça, ela retorna ao palácio para rever seu pai. Mas a rainha má tenta duas vezes fazer-lhe mal, conseguindo na segunda vez, tornando-a irreconhecível. Elisa é expulsa pelo pai, que não a reconhece, e passa a vagar pela floresta. Até que encontra uma velha que diz ter visto onze cisnes com coroas num rio próximo dali. Elisa segue o leito do rio até uma praia, na qual encontra os cisnes que, à noite, perdem as penas e o bico e revelam ser seus irmãos.

Art by Maja Chmura. Tomei liberdade de pegar essa art na página do facebook dela. <3


 Os irmãos abraçam e beijam a irmã, contam que haviam sido transformados pela rainha e haviam migrado para outro reino. E que voltavam para voar sobre sua antiga casa uma vez por ano. Após matarem a saudade, os três decidem levar a irmã com eles para aquele reino. Eles tecem uma rede durante a noite para carregar a irmã e leva-la no dia seguinte. No caminho, eles passam uma noite numa grande rocha, enquanto acontecia uma tempestade. Os irmãos se abraçam em volta da irmã, para protegê-la e se manterem firme sobre a rocha.

"O sol sumiu como as últimas chamas de um papel queimando; ela viu os irmãos se levantarem de braços dados ao seu redor, mas havia espaço apenas para cada um. As ondas batiam na pedra e os lavava como uma forte chuva. Os céus brilhavam com fogo contínuo e os raios rolavam, estrondo após estrondo. Ainda assim, irmã e irmãos seguraram-se nas mãos e cantaram um salmo que os dava conforto e coragem."
Art by Maja Chmura


 No dia seguinte, chegando ao belo reino, eles voam sobre árvores, palácios e montanhas. Até que chegam numa gruta, onde passam as noites. Elisa estava muito feliz em reencontrar seus irmãos, mas desejava muito saber como liberta-los daquele encanto. Enquanto dormia, a fada Morgana, que antes na forma de uma velha a havia indicado onde encontrar seus irmãos, contou para ela como poderia libertar seus irmãos. Deveria fazer onze casacos feitos de linho a partir de urtigas, mesmo que suas mãos ardessem como fogo. E ela não deveria dizer nenhuma palavra até que seus irmãos estivessem livres, caso contrário eles iriam morrer.

 Logo, após voltarem ao pôr-do-sol, os irmãos perceberam as bolhas nas mãos de Elisa e se alarmaram. Mas entenderam o que significava ao ver que ela estava tecendo aquelas roupas para eles. O irmão mais novo chorou e, onde suas lágrimas caíram em Elisa, a dor e as bolhas desapareceram.

 Um dia, enquanto tecia as roupas, Elisa escutou latidos e se assustou. Eram caçadores seguidos pelo príncipe daquele reino. O príncipe quando viu Elisa apaixonou-se por ela. Acabou levando-a para seu palácio e lá eles ficaram juntos até que se casassem. Elisa vivia tristonha e o príncipe, agora rei, não conseguia saber o motivo. O arcebispo, que suspeitava que a dama da floresta sussurrava maldições contra o rei, muitas tentava o avisar sobre isso. Mas o rei não lhe dava ouvidos. Até que um dia, Elisa tomou coragem e saiu escondida durante a noite para poder colher urtigas no cemitério (pois apenas essas e as da gruta serviam). O arcebispo a estava seguindo e a viu. Voltando ao castelo contou tudo ao rei, que ainda acreditava na inocência de Elisa.

 Quando já estava para completar o último casaco, Elisa foi novamente ao cemitério, mas dessa vez seguida pelo rei e o arcebispo. Ao vê-la, o rei acabou cedendo e a entregou ao povo para que julgassem-na. E as pessoas decidiram que ela fosse entregada às chamas. Na cela, a entregaram seu bolo de urtigas para que usasse de travesseiro, mal sabendo que ela não desejava algo mais precioso. Após todas as humilhações, enquanto era encaminhada para onde seria queimada, foram avistados onze cisnes descendo do céu. Os onzes voaram rapidamente até os casacos e ao vesti-los voltaram a serem belos príncipes. O mais novo acabou ficando com uma asa no lugar de um braço, porque a irmã não tivera tempo suficiente de terminar o último casaco. Agora podendo falar, Elisa provou sua inocência ao reino. Todos voltaram ao palácio numa procissão matrimonial como nenhum rei jamais vira!

 Aí a cima está um resumo que fiz da história, pra quem não a conhecia. Mas sugiro que leiam a versão original de Andersen. Os elementos que quero discutir sobre esse conto são os seguintes: a transformação em animal, os conflitos entre cristianismo e paganismo/misticismo, além das minhas opiniões sobre o conto.

Art by Anton Lomaev



 Sem dúvidas, pra mim, uma das coisas mais legais dessa história é a transformação dos irmãos em cisnes. Não é atoa que o título do conto é Os Cisnes Selvagens. A ideia de humanos se tornando animais desde sempre me chamou atenção. Essa conexão com a natureza, a vida e o selvagem. A ideia de metamorfose já é bem antiga, desde a Grécia Antiga ou antes. Um exemplo é Metamorfoses de Ovídio (que na verdade é uma coletânea de histórias e mitos gregos em grande parte envolvendo metamorfoses, mas vou ficar devendo falar mais porque ainda não li o livro). É uma ideia quase como a do berserker, que desperta uma fúria interior. A metamorfose em animais está presente em diversas culturas, e está ligada ao paganismo e ao misticismo (também está relacionada a falsas crenças da igreja em que bruxas tornavam-se gatos e outros animais). E uma coisa interessante é que, no início do conto Andersen exalta  a caracterização deles como príncipes e perfeitos: "não havia erro quanto a sua essência de príncipes reais; que pode significar a questão da nobreza ou do humano em si, porque depois eles viriam a se tornar animais selvagens, deixando de lado sua real natureza (ou parte dela).

 Na própria história existe um conflito cristão-pagão. Andersen sempre cita Deus e a crença que Elisa tem, além do arcebispo fazer o papel de um vilão menor. Porém, na realidade, quem a ajuda a desfazer o encanto é a fada Morgana (que é originária das histórias do Rei Arthur e que, apesar do nome, assemelha-se mais a uma bruxa. O que denota as mudanças de significados dos termos, pois hoje fada são seres pequenos com asas.).

 Além da transformação, a coisa mais bonita da história é a união e o amor dos irmãos. A forma que eles cuidam da irmã e a protegem.

 Não existem muitas adaptações dessa história para TV. Eu cheguei a assistir uma ou duas versões em anime e também cheguei a achar um desenho russo bem antigo. Mas parece que tem um live action dinamarquês.

 Por fim, vou deixar uma imagens que passam a vibe dos cisnes:

Howl's Moving Castle


Spirited Away


Tales of Earthsea

Wolf Children







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